terça-feira, 12 de junho de 2012

Uma análise do turismo no Brasil e suas perspectivas

Wilson Abrahão Rabahy


O turismo constitui-se em uma importante atividade econômica, capaz de impulsionar o crescimento de algumas regiões no Brasil. As atividades turísticas preponderam nas regiões mais desenvolvidas, mas, em termos relativos, a renda gerada pelo turismo no Nordeste corresponde a 6,5% do seu Produto Interno Bruto (PIB), enquanto que no Sudeste, dada sua maior diversidade de atividades produtivas, representa apenas 1,8%, sendo a média do País estimada em 2,5%. Assim, a diminuição de desigualdades regionais de renda também é um dos benefícios do turismo.
Além disso, por se constituir preponderantemente em uma atividade do setor de serviços, que notadamente utiliza mão-de-obra de forma mais intensiva, o potencial gerador de emprego do turismo também é muito relevante. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as atividades características do turismo brasileiro respondem por cerca de 6% do emprego total do País, sendo mais de 50% devido ao setor de alimentação, que, como se sabe, atende também o consumo dos não turistas. Numa versão preliminar da Conta Satélite do Turismo, estudo realizado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE), estima-se que a parcela exclusiva do emprego gerado pelo turismo é da ordem de 3,3%.
O turismo também pode resultar como importante atividade geradora de divisas, particularmente quando o excursionismo receptivo internacional é expressivo. Não é o caso ainda do Brasil, em que a relação do turismo interno é cerca de nove vezes superior ao receptivo de estrangeiros.
Tal situação é decorrente, de um lado, da força do mercado interno brasileiro, e, de outro, de sua localização, relativamente distante dos principais emissores mundiais, Europa, Ásia e América do Norte, que respondem por mais de 80% do emissivo mundial. E há o efeito do real valorizado. Assim, em termos do mercado internacional, em número de turistas, o Brasil detinha em 2009 apenas 0,54% do total.
Dado o tamanho de seu território, com diversos atrativos e belezas naturais, é adequado dizer que o Brasil ainda dispõe de enormes potencialidades para absorção de maiores parcelas desse mercado mundial., particularmente, na medida em que aumenta o tempo de lazer, há o desenvolvimento da tecnologia dos transportes diminuindo custos e o tempo das viagens, e o País se torna mais conhecido. Em especial, a partir da ocorrência de mega eventos, previstos para os próximos anos, como a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016.
Mercado mundial do turismo 
O número de viagens internacionais realizadas em todo o mundo vem crescendo consideravelmente nos últimos 50 anos (taxas de crescimento de 5,5% a.a., contra 3,6% a.a. do PIB mundial em valores constantes), embora, ao longo do tempo apresenta flutuações associadas aos ciclos da economia mundial. De certa forma, o movimento turístico vem acompanhando com vantagens o crescimento da economia mundial, medido pelo PIB, e em relação ao total das exportações mundiais.
Perspectivas do turismo brasileiro no mercado mundial 
Considerando que se verifica uma grande concentração das viagens na própria região de origem, a distante localização do País em relação às principais fontes do emissivo constitui-se em significativo fator limitante ao crescimento substancial do receptivo brasileiro. O turismo mundial atingiu, em 2008, a receita de US$ 944 bilhões, enquanto que o Brasil arrecadou deste total apenas US$ 5,78 bilhões, representando somente 0,6%, o que o posiciona na 41ª colocação.
Nesse cenário, as possibilidades de crescimento do turismo internacional no Brasil dependem principalmente, do desempenho econômico de seus países fronteiriços, inclusive em termos de taxa de câmbio e preços. Para os outros mercados as perspectivas de sua ampliação devem se dar no médio e longo prazo, a partir da valorização de atrativos únicos de que dispomos, por meio da melhoria da infraestrutura, dos serviços de apoio ao turismo, da intensificação dos mecanismos de comercialização e de promoção do turismo brasileiro, ações estas sustentadas pelo fortalecimento do turismo doméstico, e agora favorecidas pela ocorrência de grandes eventos no Brasil (Copa do Mundo e Olimpíadas, entre outros).
O principal grupo emissivo ao Brasil, em número de turistas, é a América do Sul, com 44% do total, seguido da Europa (34%) e da América do Norte (15,3%), com estas três fontes acumulando 92,5%. Merece destaque o aumento de participação da Ásia, que passou de 2,8%, em 1985, para 4,2%, em 2009.
Sabe-se também que os fluxos intercontinentais ao Brasil resultam em receitas per capita superiores à média do total das visitas internacionais, que incluem os países vizinhos. Isto ocorre porque o Brasil representa, em número de turistas, destino apenas marginal das viagens intercontinentais, caracterizando-se como uma destinação menos massificada, própria de viagens de maior distância e duração, em geral associadas ao maior nível de renda e de gastos dos visitantes. A tese implícita a esta análise é a de que as viagens intra-regionais, mais próximas, são as mais importantes em número de visitantes, mas são as que registram menores gastos per capita e as mais sensíveis às variações de câmbio e 
preços relativos.
A Conta Viagens Internacionais do Brasil
As variações cambiais acarretam significativos impactos no saldo da conta de viagens internacionais do balanço em conta corrente no Brasil. A taxa de câmbio afeta, com diferentes intensidades, o lado das receitas (gasto de estrangeiros no Brasil) e o das despesas (gastos dos brasileiros no exterior).
Do lado das receitas, pesquisas anteriores revelam que apenas os países limítrofes respondem às variações do câmbio e dos preços relativos. Como resultado, os países da América do Sul vêm revelando perdas significativas na participação no receptivo brasileiro, que passa de 58% em 1985 para 44% em 2009, posição que vem sendo ocupada pela Europa (evolui de 22% em 1985 para 34% em 2009, devido, em especial, a Itália, Alemanha, Portugal, Espanha e França), e pela América do Norte (Estados Unidos).
Quanto ao saldo da conta Turismo, alguns períodos se destacam. 
Em um primeiro momento de valorização do real, particularmente nos anos de 1997 e 1998, o déficit dessa conta chegou a quase US$ 4,5 bilhões em 1997, por conta da aceleração das despesas. De outro lado, com a desvalorização do real, observada em 2002 e 2004, são registrados saldos positivos na conta, devidos, principalmente, à expressiva queda das despesas, que passam de US$ 5,5 bilhões em 1997/1998, para US$ 2,5 bilhões em 2003/2004. A partir de 2005, com nova e gradual valorização do real e o aumento da renda do brasileiro, as despesas voltaram a crescer, o que resultou num déficit na conta viagens de U$$ 10,5 bilhões em 2010. E nessa conta não entram passagens aéreas.
Perspectivas do Turismo no Brasil
Embora a importância do turismo em uma dada economia se associe com o significado do turismo internacional, o que se verifica nos principais países é que a base para o crescimento deste setor seja propiciada pela formação e desenvolvimento do mercado interno. Mesmo em alguns casos em que o mercado externo se revela o mais importante, o mercado interno, em valores absolutos, pode representar alta significância no contexto total.
Na Espanha, um dos países mais reconhecidos como receptivo do turismo mundial, esta atividade responde por 6,6% do PIB, sendo a relação turismo interno/mundial igual a um. Nos Estados Unidos, que em valores absolutos é quase o dobro do receptivo mundial da Espanha, o seu mercado interno supera em sete vezes as receitas provenientes de outros países. No Brasil esta março/abril 2011 11 relação está próxima de nove vezes, em favor do mercado interno.
Assim, o Brasil está inserido no grupo de países em que o mercado interno do turismo predomina sobre o internacional, podendo se constituir em importante base de sustentação para o próprio turismo internacional.
Mega Eventos
Os impactos derivados da ocorrência de mega eventos (do tipo Copa do Mundo, Olimpíadas e Jogos Pan-Americanos), bem como de outros eventos especiais (Grande Prêmio de Fórmula 1, Fórmula Indy, festas de carnaval ou religiosas, e congressos internacionais, entre outros), não se restringem às avaliações de investimentos com o enfoque do retorno privado. 
Assim, devem ser avaliados seus resultados sob outras óticas, que envolvem aspectos de várias naturezas que se repercutem em prazos mais longos, denominados “legados” desses investimentos.
Baseando-se na experiência dos Jogos Pan-Americanos, tudo indica que o legado foi particularmente desfavorável no que diz respeito à gestão, com implicações nos custos, e quanto à utilização posterior da infraestrutura de equipamentos desportivos. As previsões do orçamento do evento foram fortemente ultrapassadas na execução. Além disso, os estádios, a vila olímpica, o parque aquático, entre outros equipamentos desportivos, construídos com recursos públicos, se transformaram, após o evento, em verdadeiros “elefantes brancos”, como o caso do Estádio Olímpico João Havelange, o Engenhão, no Rio de Janeiro (RJ), que, por falta de previsão de sua utilização posterior, foi cedido a um clube de futebol em condições vantajosas e com relativamente baixo retorno para a sociedade.
Essa parece ser também desde já a perspectiva quanto à modernização ou construção de estádios previstos para a Copa de 2014. O governo federal, por meio do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), se dispõe a financiar parte significativa desses estádios, desde que se demonstre um retorno adequado. Ora, até aqui os estádios no Brasil têm sido utilizados apenas para partidas de futebol. Vale mencionar que a frequência aos estádios brasileiros em jogos do campeonato da primeira divisão de 2009, alcançou média de 17.807 espectadores; enquanto que, nos campeonatos alemão e inglês, por exemplo, essa média foi de 42.565, e 35.600, respectivamente. Na Copa de 2006 na Alemanha, 62% dos estádios vieram de projetos de empresas de vários setores. Enquanto isso, no Brasil, estima-se que dos R$ 5,3 bilhões previstos oficialmente para essa finalidade, R$ 3,5 bilhões serão desembolsados pelos governos estaduais, com participação de financiamento federal de R$ 400 milhões por unidade do BNDES.
Esse alto custo decorre de exigências da FIFA e que foram aceitas pelo Brasil sem questionamentos aumentando consideravelmente os custos do evento. Vale lembrar a propósito que, no caso de São Paulo, onde o maior estádio é de propriedade de um clube privado, este não teve condições de atender aos requisitos da FIFA, que desejava uma reforma de valor vultoso, e que o clube não se viu em condições de enfrentar, mesmo recorrendo a investidores privados.
Nesse cenário tudo indica que no caso dos estádios será inevitável um amplo legado de “elefantes brancos”. De qualquer forma, pela experiência do Pan, seria importante um empenho muito maior na gestão desses empreendimentos, para evitar que se tornem ainda mais caros por revisões orçamentárias injustificáveis e outras distorções que costumam acontecer diante de fatos consumados impostos pela necessidade de concluir os estádios a tempo do evento.
Na infraestrutura em torno dos estádios, áreas adjacentes e para o acesso ao mesmo é que há espaço para um legado efetivamente utilizável pela população e capaz de gerar um retorno adequado. É aí que o esforço governamental deve concentrar sua atenção, e novamente de olho na gestão e execução dos projetos, sem desconsiderar, contudo, os custos de oportunidade do montante de gastos com esses investimentos em relação à escala de prioridades da população brasileira.
*Wilson Abrahão Rabahy é Economista, Titular do Curso de Turismo na Escola de Comunicação e Arte da Universidade de São Paulo (ECA/USP), Pesquisador Sênior da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) e Conselheiro do CORECON-SP 

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