quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Saída de Cuba do Mais Médicos afeta 28 milhões de pessoas, diz Confederação dos Municípios Governo cubano atribuiu decisão a 'declarações ameaçadoras e depreciativas' de Bolsonaro. Em nota, CMN disse acreditar que governo de transição encontrará solução para manter programa.

Por Filipe Matoso, G1 — Brasília - 15/11/2018 17h29  Atualizado há 23 minutos

'Mais Médicos' começaram a receber médicos cubanos em 2013  — Foto: TV Verdes Mares/Reprodução
'Mais Médicos' começaram a receber médicos cubanos em 2013 — Foto: TV Verdes Mares/Reprodução
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) divulgou uma nota nesta quinta-feira (15) na qual informou que a saída de cubanosdo programa Mais Médicos afetará 28 milhões de pessoas.
Nesta quarta (14), o presidente eleito Jair Bolsonaro informou que o governo cubano decidiu deixar o programa por não concordar com testes de capacidade.
O Ministério de Saúde Pública de Cuba, contudo, informou ter tomado a decisão em razão de "declarações ameaçadoras e depreciativas" de Bolsonaro. Em agosto, ainda em campanha, Bolsonaro declarou que "expulsaria" os médicos cubanos do Brasil.
"O valor do Programa Mais Médicos (PMM), ecoado nos diversos cantos do Brasil, demonstrou ser uma das principais conquistas do movimento municipalista frente à dificuldade de realizar a atenção básica, com a interiorização e a fixação de profissionais médicos em regiões onde há escassez ou ausência desses profissionais", afirmou a CNM em nota.
"Entre os 1.575 Municípios que possuem somente médico cubano do programa, 80% possuem menos de 20 mil habitantes. Dessa forma, a saída desses médicos sem a garantia de outros profissionais pode gerar a desassistência básica de saúde a mais de 28 milhões de pessoas", acrescentou a entidade.
Mais cedo, nesta quinta-feira, o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, avaliou em entrevista à GloboNews que a decisão do governo cubano é "ruim" e "hostil".
"Eu acho ruim [a saída], porque isso foi uma política que permitiu o atendimento para pessoas que não teriam acesso de outra forma, são 8 mil médicos. Mas nós vamos resolver essa questão de outra forma, o Ministério da Saúde está tomando já providências para suprir essa ausência", afirmou Aloysio Nunes à GloboNews.
"É uma decisão que o governo cubano já tomou, acho uma decisão hostil, sem cabimento", acrescentou.
Cuba enviava profissionais ao Brasil desde 2013. No Mais Médicos, pouco mais da metade dos profissionais – 8,47 mil dos mais de 16 mil profissionais – vieram de Cuba, segundo dados obtidos pelo G1.
'Extrema preocupação'
Ainda na nota divulgada nesta quinta, a Confederação Nacional dos Municípios afirmou que a situação é de "extrema preocupação" e exige a superação "em curto prazo".
"Acreditamos que o governo federal e de transição encontrarão as condições adequadas para a manutenção do programa. Enquanto aguardamos a rápida resolução do ocorrido pelo órgão competente, estamos certos de que os gestores municipais manterão o máximo empenho para seguir o atendimento à saúde de suas comunidades", afirmou a entidade.
Cubana que trabalha em São Miguel Arcanjo comenta sobre o reflexo da saída dos profissionais do país. Cidade com quase 33 mil habitantes tem mais médico cubano que brasileiro no programa 'Saúde da Família', aponta Secretaria de Saúde.
Médicos cubanos atuam em postos de saúde de São Miguel Arcanjo — Foto: Reprodução/ TV TEM
Médicos cubanos atuam em postos de saúde de São Miguel Arcanjo — Foto: Reprodução/ TV TEM
"Eu voltarei feliz para meu país. Feliz por saber que cumpri minha responsabilidade como médica. Mas fico triste pelo Brasil e por deixar pacientes que precisam de nós. Deixarei gente que precisa do nosso trabalho, do nosso cuidado".
A afirmação é da médica cubana Evelyn Fernandes, de 28 anos, que faz parte de um grupo de médicos cubanos do programa social 'Mais Médicos', que atua em São Miguel Arcanjo, interior de São Paulo.
O governo de Cuba informou na quarta-feira (14) que decidiu sair do programa social Mais Médicos, citando "referências diretas, depreciativas e ameaçadoras" feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) à presença dos médicos cubanos no Brasil.
O país caribenho envia profissionais para atuar no Sistema Único de Saúde desde 2013, quando o governo da então presidente Dilma Rousseff (PT) criou o programa para atender regiões carentes sem cobertura médica.
Médica cubana Evelyn Fernandez atua no interior de SP há um ano — Foto: Reprodução/TV TEM

Médica cubana Evelyn Fernandez atua no interior de SP há um ano — Foto: Reprodução/TV TEM
De acordo com Evelyn, ao todo são sete médicos que trabalham nos postos de saúde da cidade, que tem cerca de 33 mil habitantes. Para ela, que está há um ano no Brasil, será prejudical a retirada dos profissionais cubanos.
"Eu vim com o grupo disposta a ajudar as pessoas. Vim com o grupo e fiquei muito feliz. Atendo hoje o posto de saúde da área central e pessoas da zona rural. São pacientes que necessitam da gente. A cidade vai sentir muito e isso será um reflexo no Brasil também", diz.
A médica conta que já atuou três anos na Venezuela e que exerce a medicina como forma de responsabilidade social.
"Eu trabalho de coração. Vim para servir. Fico triste pelo Brasil, mas volto sabendo que fiz o meu melhor".
Questionada sobre uma data em relação à saída dos profissionais da cidade, Evelyn ainda não sabe.
"Ainda não temos data e pode ser que seja logo ou demore um pouco. Mas assim que nos informarem, retornarei para Cuba."
Reflexo
Primeiros médicos cubanos chegaram em 2014 em São Miguel Arcanjo — Foto: Divulgação/Prefeitura de São Miguel Arcanjo
Primeiros médicos cubanos chegaram em 2014 em São Miguel Arcanjo — Foto: Divulgação/Prefeitura de São Miguel Arcanjo
Em 2014, a cidade de São Miguel Arcanjo foi contemplada com a vinda dos médicos cubanos.
De acordo com a secretária de Saúde Katia Raskivicius, desde então, das 10 equipes do "Saúde da Família" que atuam nos postos de saúde dos bairros, seis são formadas por médicos cubanos.
"Tem mais médico cubano que brasileiro na cidade. Então, certamente sentiremos muito com a saída desses profissionais. São sete médicos estrangeiros contra três. Quando recebermos a data da saída, teremos que fazer um esquema com os três profissionais que temos até recebermos novos. Os postos não ficarão sem médicos, mas terá um grande impacto", afirmou ao G1.
Ainda segundo a secretária, cada profissional atende 24 pacientes por dia. Com isso, Katia acredita que o município precisará abrir concursos públicos.
"Vamos ter que abrir concursos públicos e ter um plano B. Ainda não sabemos como vai ser e vamos aguardar as diretrizes do Ministério da Saúde. Mas certamente haverá impacto em São Miguel Arcanjo, sem contar no impacto social."
Expulsão pelo Revalida
Em agosto, ainda em campanha, Bolsonaro declarou que ele "expulsaria" os médicos cubanos do Brasil com base no exame de revalidação de diploma de médicos formados no exterior, o Revalida. A promessa também estava em seu plano de governo.
Fora do Mais Médicos, os formados no exterior não podem atuar na medicina brasileira sem a aprovação no Revalida. Mas no caso do programa federal, todos os estrangeiros participantes têm autorização de atuar no Brasil mesmo sem ter se submetido ao exame.
O Ministério da Saúde recebeu comunicado da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), no qual o governo cubano informa que encerrou sua parceira no programa Mais Médicos. Diante do fato, o governo federal está adotando todas as medidas para garantir a assistência dos brasileiros atendidos pelas equipes da Saúde da Família que contam com profissionais de Cuba.
A iniciativa imediata será a convocação nos próximos dias de um edital para médicos que queiram ocupar as vagas que serão deixadas pelos profissionais cubanos. Será respeitada a convocação prioritária dos candidatos brasileiros formados no Brasil seguida de brasileiros formados no exterior.
Desde 2016, o Ministério da Saúde vem trabalhando na diminuição de médicos cubanos no programa. Até aquela data, cerca de 11.400 profissionais de Cuba trabalhavam no Mais Médicos. Neste momento, 8.332 das 18.240 vagas do programa estão ocupadas por eles.
Outras medidas para ampliar a participação de brasileiros vinham sendo estudadas pelo Ministério da Saúde, como a negociação com os alunos formados através do FIES (Programa de Financiamento Estudantil). Essas ações poderão ser adotadas, conforme necessidade e entendimentos com a equipe de transição do novo governo.
O Ministério da Saúde reafirma e tranquiliza a população que adotará todas as medidas para que profissionais brasileiros estejam atendendo no programa de forma imediata.

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