sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Mortes por asfixia (asfixiologia forense): classificação e sinais diagnósticos

Traumatologia ou Lesonologia Médico-Legal é um dos maiores capítulos dentro do estudo da especialidade Medicina Legal e Perícia Médica; nele se investiga o mecanismo que originou o trauma e a lesão por ele provocada (Paradigma médico-legal: a lesão é que caracteriza o agente). Trauma é definido como uma energia de ordem externa sobre o individuo, modificando seu estado de equilíbrio fisiológico (com ou sem tradução morfológica) de modo reversível ou irreversível; e lesão é traduzida como alteração estrutural proveniente de uma agressão ao organismo. 

Leia também: A perícia do alegado erro médico – Medicina Legal e Perícias Médicas

Estratificação

Os agentes vulnerantes são estratificados de acordo com características em comum:  

Flamínio Fávero adota a classificação de Borri:

Mecânica, Física, Química, Físico-química, Bioquímica, Biodinâmica e Mista; 

Helio Gomes, por sua vez, as divide entre:

Física (mecânica, barométrica, térmica , elétrica, radiante); 

Química (venenos, cáusticos);

Físico-Química.

Analisando especificamente as energias de ordem físico-química, são aquelas que impedem a passagem do ar pelas vias respiratórias e alteram a bioquímica do sangue, produzindo um fenômeno conhecido como asfixia. 

Para que ocorra a Hematose (transformação do sangue venoso em sangue arterial nos alvéolos pulmonares, através de uma troca de gases devido à diferença de concentração de oxigênio e gás carbônico por difusão), são necessários diversos fatores como o meio ambiente e composição dos gases — aéreo, sólido, liquido ou outros gases inertes —, orifícios e vias aéreas permeáveis, elasticidade do tórax, expansão pulmonar, ventilação pulmonar, circulação e bioquímica sanguínea e pressão atmosférica compatível; qualquer prejuízo em alguma dessas fases podem gerar déficit na troca gasosa. 

Classicamente o que se estuda na Asfixiologia Forense são os estados em que o prejuízo da ventilação pulmonar são causadas por meios mecânicos como enforcamento, estrangulamento, esganadura, mas também existem outros mecanismos de asfixia que serão detalhados a seguir.

Os efeitos da redução de oxigênio do sangue arterial (hipoxemia) e aumento do teor de CO2 (hipercapnia) se dividem em fase cerebral, fase de excitação cortical e medular, fase respiratória e cardíaca com o aumento da pressão arterial, frequência cardíaca e respiratória, sonolência, obnubilação, fraqueza muscular, cefaleia, cianose, náuseas e vômitos, convulsões, coma e morte.

Existem sinais gerais de asfixia, presentes na maioria dos casos, mas importante frisar que não são patognomônicos, mas orientam quanto a ocorrência de um quadro possivelmente asfíxico, sendo eles sinais externos e internos.

Sinais externos: Cianose, exoftalmia, hemorragia conjuntival, petéquias em pele e mucosa, protrusão da língua, espuma na boca e narinas e hipóstases precoces, escuras e abundantes 

Sinais internos: Manchas de Tardieu (equimoses diminutas, localizadas na pleura visceral, sulcos interlobares e bordas dos pulmões, pericárdio, entre outros órgãos abdominais com coloração violácea, número variável, esparsas ou aglomeradas), congestão polivisceral, sangue fluído e escuro e demais sinais específicos de cada tipo de asfixia (ex: manchas de Paltauf, máscara equimótica de Morestin, congestão compressiva de Perthes, sinal de Valentin, sinal de Brouardel, sinal de Niles, sinal de Amussat-Divergie-Hoffmann, entre outros.)

As mortes asfixicas podem ser divididas em naturais (doenças que reduzem a ventilação ou circulação pulmonar ou que provoque tal dificuldade) e violentas (decorrentes de traumatismo).

Subtipos: 

Anoxia ou hipóxia — causas externas ou internas;

Anoxia de ventilação ou anóxica;

Anoxia anêmica;

Anoxia de circulação e de estase;

Anoxia tissular ou histotóxica;

Apneia sem acumulo de gás carbônico;

Asfixias mecânicas;

Anoxia com acapneia;

Anoxia com hipercapneia: acumulo de gás carbônico.

Classificação (Oscar Freire e Flamínio Fávero): 

Alteração da dinâmica respiratória:

Constrição cervical:

Enforcamento: asfixia mecânica produzida por constrição cervical por meio de um laço acionado pelo peso da própria vitima (pode ser por suspensão completa ou incompleta, e na maioria das vezes é de origem suicida).

Estrangulamento: asfixia por constrição do pescoço por um laço acionado por meio diverso ao peso da vitima (podendo ser homicida ou acidental).

Esganadura: asfixia por constrição do pescoço exercida pelas mãos do agressor. 

Carga aproximada para obliteração das vias aéreas e vasos do pescoço:

2 Kg obliteram as jugulares 

5 Kg obliteram as carótidas 

25 Kg obliteram as artérias vertebrais

10 Kg obliteram a laringe

25kg obliteram a traqueia. 

Obstrução das vias aéreas ou impedimento da expansão da caixa torácica: 

Sufocação direta: asfixia mecânica com obstrução à penetração do ar nas vias respiratórias desde o nariz/boca até a traqueia. (ex: engasgue – corpo estranho) 

Sufocação indireta: Aquela causa pela compressão externa do tórax, impedindo os movimentos respiratórios.

* Sufocação Posicional: Crucificação ou individuo em posição de “cabeça para baixo” — Mecanismo de morte: Fadiga aguda dos músculos da respiração, seguida de apneia e anoxia.

* Pela compressão torácica há dificuldade no retorno venoso pelas veias cavas superior e inferior e o enchimento cardíaco. O sangue fica acumulado no sistema venoso, com grande aumento da pressão nas extremidades venosas dos capilares e vênulas.

* Face de cor arroxeada bem escura devido a numerosas petéquias, conhecida como Máscara Equimótica de Morestin.

* Fratura de costelas, sinais externos de luta ou araste podem ser encontradas nesse e em outros casos.

* Em movimentos de imobilização onde se projeta o peso do corpo sobre o outro, em soterramentos, dispersão de grandes multidões com pisoteamento ou compressão em locais confinados, esse mecanismo de sufocação indireta também pode ser encontrado, a depender dos sinais encontrados no exame necroscópico.

Saiba mais: Medicina Legal e Pericias Médicas: áreas de estudo e atuação profissional

Modificações do meio ambiente: 

Soterramento (meio pulvurulento) 

Afogamento (meio líquido)

Fisiopatologia do óbito:

Fase de defesa, resistência e exaustão ao afogamento.

Fase de surpresa e de dispneia

Fase de resistência com a parada movimentos respiratórios

Fase de exaustão: inspiração profunda, asfixia com perda da consciência, insensibilidade, convulsões e morte.

Confinamento (ambientes fechados, por vez acidental ou aglomerações)

Gases inertes:  Asfixia produzida pela substituição do ar por um gás inerte não tóxico.

A conclusão de um laudo em morte por asfixia depende de diversos fatores particulares em análise com um exame necroscópico detalhado, podendo ser complementado com estudo químico-laboratorial; a complementação da investigação depende da análise do local dos fatos, depoimento de testemunhas, entre outros para identificação do suspeito e outras elucidações do caso.

Autor(a): Luiz Fernando Segura

Graduado em Medicina pela Universidade de Mogi das Cruzes (FMUMC) ⦁ Médico residente em Medicina legal e Perícia médica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) ⦁ Pós-graduado em Medicina legal e Perícia médica pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) ⦁ Pós-graduando em Medicina do Trabalho no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) ⦁ Pós-graduando em Medicina do Tráfego na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

Referências bibliográficas: 

França GV. Medicina Legal, 8ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p. 01.

Hercules, HC. Medicina Legal – Texto e Atlas. São Paulo: Editora Atheneu, 2005.

Fonte: PORTAL PEBMED - https://pebmed.com.br/mortes-por-asfixia-asfixiologia-forense-classificacao-e-sinais-diagnosticos/


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